Sem pressa para ler
É provável que você, que está lendo essas poucas linhas, viva em um país no qual há mais farmácias do que livrarias. E não apenas mais, mas na verdade muito mais, e essa diferença parece estar aumentando exponencialmente. Mas será que isso é um problema? A julgar por estudos de vários especialistas estrangeiros, em países estes onde a tradição da leitura é muito maior que a brasileira, parece que há sim um problema nesta área.
De qual área se trata aqui? Exatamente da área do conhecimento, do estudo, da compreensão de textos e do entendimento. O fato é que muitos pesquisadores estão começando a constatar que hoje temos problemas não só com a falta de leitura, mas também com os dispositivos atuais mais utilizados para leituras, principalmente os smartphones. Pois enquanto a tecnologia avança a passos cada vez mais largos, as pessoas parecem estar aprendendo e compreendendo cada vez menos.
Na verdade, é até intuitivo perceber como a mera “passada de olhos” por telas sucessivas, seja de pequenos textos ou de postagens online, exigem cada vez menos atenção do leitor e, por consequência, diminuem sua capacidade de compreensão. É o que constata a neurocientista cognitiva americana Maryanne Wolf, autora do livro “O cérebro no mundo digital: os desafios da leitura na nossa era”. Em suas palestras, Wolf vem relatando o quanto as pessoas se queixam de não mais conseguir se concentrar em textos longos, ou seja, não conseguem “mergulhar” na leitura tão profundamente quanto conseguiam antes, tendo reduzida sua capacidade de prosseguir a leitura de textos mais complexos e até mesmo fazer uma análise crítica do que estão lendo.
Em um cenário de leituras “apenas superficiais”, o circuito da leitura no cérebro não vai alocar tempo suficiente para um processamento cognitivo necessário para um processamento crítico, diz a autora. A conclusão desse estado de coisas é que, sendo a mente humana uma espécie de “órgão” que – assim como acontece com o nosso corpo – com o desuso ou falta de melhores treinamentos, tende a se tornar flácida e preguiçosa. Então, não é de espantar que as novas facilidades proporcionadas pelas tecnologias digitais, ou pelas novas inteligências artificiais, ao lado das muitas vantagens e facilidades que oferecem, tragam também o risco de tornar as pessoas cada vez menos capazes de aprender e reter informações. E desse jeito teremos, sim, cada vez mais farmácias… e menos livrarias. Ao que parece, não mais só no nosso país.